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Quando produto é devolvido, loja não pode pegar de volta comissão de vendedor

O empregador não pode estornar as comissões do seu vendedor se a venda não restou adimplida ou se a mercadoria acabou devolvida à loja. É o que sinaliza a regra geral extraída dos artigos 2º e 466 da Consolidação das Leis do Trabalho, bem como do artigo 3º da Lei 3.207/57 (Lei dos Vendedores, Viajantes e Pracistas).

Em face do entendimento, a 4ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-RS) garantiu a ex-vendedor de uma grande loja de materiais de construção de Porto Alegre a devolução de descontos efetuados em suas comissões. A decisão reforma, no aspecto, sentença proferida pela 2ª Vara do Trabalho de Porto Alegre.

O acórdão foi lavrado na sessão telepresencial de 16 de setembro. Da decisão, ainda cabe recurso ao Tribunal Superior do Trabalho (TST).

O processo

Segundo os autos da ação reclamatória, a loja estornava a comissão do empregado quando o comprador devolvia a mercadoria. O juízo de primeiro grau entendeu não haver ilegalidade na atitude do empregador, nos termos do artigo 466, caput e parágrafo 1º, da CLT, julgando improcedente o pedido. O autor, então, recorreu ao TRT-RS, pedindo a reforma do julgado.

Para o relator do acórdão na 4ª Turma, desembargador André Reverbel Fernandes, a regra geral trazida pela CLT e Lei dos Vendedores diz que não cabe o desconto de comissões sobre negócios finalizados pelo vendedor, independentemente de a transação ser prejudicada por fatos futuros — como a devolução de mercadorias ou o inadimplemento dos clientes.

Conforme o julgador, "efetivada a venda, exaure-se a competência do empregado, de modo que os problemas ocorridos posteriormente não podem afetar a remuneração variável que lhe é devida, sob pena de irregular transferência dos riscos da atividade econômica".

Exceção à regra

O magistrado explicou que a exceção a esta regra é trazida pelo artigo 7º da mesma Lei 3.207/57, que autoriza o estorno de comissões quando verificada a insolvência do comprador. A hipótese excepcional, destacou o julgador, abrange tão somente as situações de efetiva insolvência e não o mero inadimplemento ou devolução.

Assim, o relator concluiu não serem lícitos os descontos efetuados pela loja, razão pela qual deferiu ao autor o pagamento de diferenças, no percentual que fixou em 5% sobre a quantia percebida em cada mês da contratualidade sob o mesmo título, com reflexos em repousos semanais remunerados e feriados, 13º salário, férias com 1/3, aviso-prévio e FGTS com 40%.

A decisão foi unânime na 2ª Turma. Também participaram do julgamento as desembargadoras Maria Silvana da Rotta Tedesco e Ana Luíza Heineck Kruse. Com informações da Assessoria de Imprensa do TRT-RS.

 

 

 

Empresa de SC pagará R$ 48 milhões à União por extração ilegal de minério

Na última terça-feira (6/10), o Tribunal Regional Federal da 4ª Região manteve a condenação de uma mineradora por extração ilegal de brita numa área pertencente ao município de Ibirama (SC). 

Os recursos minerais constituem bens públicos da União, a teor do artigo 20, inciso IX, e do artigo 176, ambos da Constituição. A empresa ré atuava na lavra ilegal desde agosto de 2011, extraindo maior volume do que o legalmente permitido.

Em valores atualizados, a União irá receber R$ 48 milhões a título de reparação por danos patrimoniais, segundo cálculos feitos pelo site Espaço Vital.

Assim como o juízo de origem, os desembargadores entenderam que o pedido de recuperação da área degradada — e seus reflexos, como indenização por degradação ambiental — restou prejudicado, já que a área continua sendo explorada pela empresa ré na ação. A cessionária tem permissão de lavra até 2022.

Ação civil pública

A União ajuizou ação civil pública contra a mineradora catarinense em maio de 2014 na 1ª Vara Federal de Rio do Sul. Na inicial, pediu ressarcimento do prejuízo causado pela extração de brita sem autorização; a recuperação do meio ambiente, que ficou degradado em função da operação extrativista, com base em plano aprovado por órgão ambiental; e indenização por dano moral ambiental coletivo, verba direcionada ao Fundo de Defesa dos Direitos Difusos.

Na primeira instância, o juízo da Vara concedeu tutela liminar de urgência à União. Determinou a cessação das atividades de lavra mineral de brita nas áreas afetadas em Ibirama e o bloqueio de todos os bens existentes em nome da mineradora.

Ao julgar o mérito da ação, em dezembro de 2018, o juízo acolheu em parte os pedidos formulados pela União. Condenou a ré ao pagamento da indenização por danos patrimoniais, no valor fixado em R$ 11,4 milhões, e manteve o bloqueio dos bens.

"Ficou plenamente demonstrado, nesse contexto, que a demandada — não obstante não se lhe possa atribuir responsabilidade pela extração de todo o volume da cava existente no local em questão — promoveu mineração de forma irregular na área do Processo DNPM n. 815.478/2010, e que, como se viu, está suficientemente provado que isso ocorreu a partir de 01/08/2011", registrou a sentença lavrada pelo juiz federal Vinícius Savio Violi.

Ele também julgou improcedente a pedido de recuperação do meio ambiente. "A recuperação da área não pode ser levada a efeito no momento, pois a área do Processo Administrativo n. 815.478/2010 continua sendo explorada pela demandada (sua cessionária), cuja autorização ambiental vigorará até o ano de 2022, ao menos. Logo, a recuperação da área degradada em razão da extração mineral fica impossibilitada. E, com isso, fica igualmente prejudicada a pretensão de condenação ao pagamento de indenização por dano moral ambiental coletivo", finalizou.

Recursos ao TRF-4

Empresa e União recorreram da sentença ao TRF-4. Na apelação admitida na 3ª Turma da corte, a mineradora alegou inexistência de dano material devido à regularidade da extração com a edição de portaria expedida pelo Ministério de Minas e Energia autorizando a lavra de minérios na área. Afirmou que a condenação compreende o período de agosto de 2011 a setembro de 2017, sem considerar que houve regularização da atividade de extração mineral para o período de fevereiro de 2014 a fevereiro de 2015. Além disso, a licença de exploração de minério foi renovada até a data da sentença através de diversas portarias emitidas pelo Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM).

Já a União defendeu que a indenização deve ser fixada num patamar mais elevado. O cálculo da indenização deve levar em conta a integralidade do minério extraído, pelo valor de mercado da brita, sem abatimento dos custos de produção. Afirmou também que a extração ilegal foi reconhecida em 2011 e que a autorização obtida em 2014 não abrange a quantidade de minério que havia sido extraída nos anos anteriores.

Indenização elevada

A desembargadora federal Marga Inge Barth Tessler, relatora dos recursos no colegiado, negou provimento ao apelo da empresa. "Não há como ser acolhida a alegação da parte ré no sentido de que toda a lavra passou a ser autorizada a partir de 2014, com a emissão da guia de utilização. Referida guia consistiu em autorização específica para exploração de pequena monta e por limitado período, ou seja, de fevereiro de 2014 a fevereiro de 2015. Através desta guia, foi autorizada a exploração de 50.000 toneladas de minério, quantidade significativamente inferior ao montante extraído pela empresa", discorreu no voto.

Para Marga, tal autorização não torna lícita a atividade ilícita até então praticada, nem torna legítima a exploração da quantia excedente à efetivamente permitida. "Ademais, a expedição da guia não permite concluir que a condenação deveria limitar-se ao que foi extraído até 2014. À exceção da quantia autorizada, todo o excedente é ilegal e, assim, sujeito à indenização. Sublinhe-se que o volume autorizado foi abatido do quantum final para o cálculo da indenização", complementou.

Quanto ao recurso da União, a desembargadora entendeu que a apelação deve ser provida. No entendimento da julgadora, a indenização, em razão do ato ilícito, deve ser suficiente para reparar o dano causado; ou seja, deve ser equivalente, de forma hipotética, à reposição do minério extraído do seu local de origem.

"Nesse contexto, a indenização, no caso em análise, deve se dar pelo valor de comercialização do minério irregularmente extraído pela parte ré, por corresponder ao preço ordinário do minério, de propriedade da União, o qual foi indevidamente retirado da natureza pela ré".

Em conclusão, a relatora definiu que "o valor a ser indenizado corresponde a R$ 22.885.081,30, o qual deve ser atualizado, tendo sido reconhecida a lavra ilegal a partir de 01/08/2011, devendo esse ser também o termo inicial dos juros de mora".

Cálculo extraoficial — realizado pelo Espaço Vital — aponta para outubro corrente, com correção e juros (estes de nove anos e dois meses, no percentual de 1% ao mês), a cifra condenatória atualizada em R$ 48,05 milhões. Não há trânsito em julgado Com informações da Assessoria de Imprensa do TRF-4 e Espaço Vital.

 

Governo Federal institui o Programa de Retomada Fiscal.

Em parceria com a Fazenda Nacional, o Ministério da Economia instituiu através da Portaria nº 21.562 o Programa de Retomada Fiscal, destinado ao auxílio à regularização de débitos inscritos na Dívida Ativa da União, especialmente em relação à atividade cuja produção tenha sido afetada pela pandemia da COVID-19.

Por intermédio do Programa de Retomada Fiscal, serão disponibilizadas aos contribuintes amplas modalidades de transações tributárias, possibilitando, inclusive, a inserção daqueles contribuintes que já tenham formalizado outros acordos junto aos Órgãos Federais.

Destaca-se como vantagens à adesão ao Programa a concessão de Certidão Negativa de Débito (CND), ou Positiva com Efeitos de Negativa (CPD-EM), bem como a suspensão do registro no CADIN.

Finalmente, também poderá ser concedida a suspensão da apresentação de protestos de Certidão de Dívida Ativa, além da sustação dos protestos já apresentados, além de suspensão das execuções fiscais e pedidos de bloqueio judicial de contas bancárias.

Por fim, todos os procedimentos para adesão às transações contidas na Portaria nº 21.562 deverá ser realizado no portal Regularize até o dia 29 de dezembro de 2020.

 

NJ - Justiça do Trabalho confirma justa causa de empregada que preencheu documentos da empresa com dados falsos

A alegação de que os dados eram falsificados por ordem do chefe não foi comprovada.

A Justiça do Trabalho mineira validou a dispensa por justa causa aplicada a uma ex-empregada de rede varejista de eletrônicos e móveis que falsificou assinaturas de clientes em contratos de cartão de crédito.  A decisão é dos julgadores da Oitava Turma do TRT de Minas, ao reformar sentença de 1º grau.

Na versão da trabalhadora, ela teria sido obrigada pelo gerente a falsificar assinaturas de clientes em contratos de cartões de créditos, para cumprir as metas estabelecidas. Segundo alegou, o chefe fazia constantes ameaças de dispensa, caso não fosse realizada a falsificação. Aos clientes era dito que seria realizada uma simples atualização do cadastro, quando, na verdade, era emitido o cartão de crédito. Além da reversão da justa causa, a empregada pediu uma indenização por danos morais, alegando que os coordenadores exigiam também a venda de seguros, SMS e crédito pessoal. 

Em defesa, a empresa sustentou que a justa causa se deu por “ato de improbidade”, nos termos do artigo 482, letra "a", da CLT, e somente foi aplicada após apuração dos fatos em auditoria interna.

A tese da empregadora, inicialmente rejeitada em primeiro grau, foi acatada pelo desembargador José Marlon de Freitas, relator do recurso apresentado pela ré. Para ele, a ex-empregada não conseguiu provar, como deveria, que era obrigada a realizar a falsificação dos contratos de cartão de crédito em cumprimento de ordem de seu superior hierárquico. Tampouco ficou demonstrado que ele soubesse, como ela alegou.

De todo modo, no entendimento do relator, a trabalhadora não poderia agir contrariamente à lei, principalmente por se tratar de procedimento que violava norma de conduta interna da empresa e que lhe proporcionava benefício indireto. Ficou demonstrado que a empregada sabia que a conduta feria o compromisso firmado de trabalhar com ética e com a observância das normas e diretrizes da empresa, uma vez que assinou termo de conduta e aceite quando foi contratada.

“A obreira não pode, agora, se declarar vítima, já que era partícipe de ato manifestamente ilícito, inclusive, caracterizado como conduta abusiva pelo CDC (artigo 39, III)”, destacou o relator, invocando na decisão o artigo 153 do Código Civil, segundo o qual “não se considera coação a ameaça do exercício normal de um direito, nem o simples temor reverencial”.

O magistrado não acreditou na declaração da testemunha indicada pela autora de que o gerente impunha somente a ela e a outro colega a obrigação de fraudar os contratos. Afinal, conforme ponderou, no local de trabalho havia outros empregados que desenvolviam as mesmas funções e que não eram obrigados a realizar o mesmo ato. O desembargador considerou “desarrazoada” a afirmação da testemunha de que a autora teria aprendido a falsificar o documento com o gerente, uma vez que alegação sequer constou da petição inicial. Ele também estranhou o fato de a autora e a testemunha terem afirmado que não denunciaram as situações a superiores hierárquicos do gerente.

“Qualquer pessoa de conhecimento mediano saberia que a assinatura de contrato de cartão de crédito, sem a autorização do cliente, é uma conduta, no mínimo, atípica e indevida, e, assim sendo, era dever da autora ter relatado tal fato ao setor competente para adotar as medidas necessárias para obstaculizar a suposta conduta e, por consequência, o alegado assédio”, enfatizou.

Na decisão, lembrou ainda que o Código Penal não exclui a responsabilidade de quem age no cumprimento de ordens manifestamente ilegais (artigo 22). Ponderou que, se nem mesmo a responsabilidade criminal é afastada, do mesmo modo há de se preservar a cível e a trabalhista. Para o julgador, o fato de a conduta fraudulenta ter gerado ou não prejuízos para a empresa pouco importa. Também considerou dispensável prova de que a trabalhadora tenha sido diretamente beneficiada pelo esquema.  Conforme frisou o relator, para a dispensa por justa causa, basta a constatação de que a trabalhadora, indevidamente, assinava contratos de cartão de crédito em nome de clientes, sem que fosse por eles autorizada.

Diante do apurado nos autos, o desembargador reconheceu a validade da dispensa por justa causa, com amparo no artigo 482, a, da CLT (ato de improbidade). Dessa forma, declarou indevida a condenação da reclamada ao pagamento das verbas trabalhistas, decorrentes da declaração da dispensa imotivada. Não havendo provas do alegado assédio moral, também foi considerada indevida a indenização por danos morais.  A varejista foi absolvida da totalidade da condenação imposta anteriormente, sendo a decisão acompanhada pelos julgadores da Turma.

 

Danos morais gerados a pessoa jurídica por venda de produtos falsificados podem ser presumidos, decide Terceira Turma

A comercialização de produtos falsificados afeta a identidade construída pelo titular da marca, resultando na mudança de público-alvo e desvirtuando as qualidades que o proprietário busca ver atreladas à sua imagem. Por isso, os danos extrapatrimoniais gerados pela comercialização ilícita de produtos e serviços não dependem de prova para que possam ser compensados. 

O entendimento foi fixado pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao reformar acórdão do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) que, apesar de ter reconhecido a existência de danos materiais em episódio de venda de produtos falsificados, afastou a condenação das vendedoras ao pagamento de danos morais por concluir que o uso indevido de uma marca não implicaria, necessariamente, dano extrapatrimonial à pessoa jurídica titular desse direito. Para o TJSC, a violação à honra e à imagem deveria ser concretamente demonstrada pelo titular.

De acordo com o relator do recurso do proprietário da marca, ministro Paulo de Tarso Sanseverino, o entendimento tradicional do STJ é no sentido de que os danos morais experimentados pela pessoa jurídica – diferentemente daqueles sofridos pela pessoa física – não são presumidos, devendo ser comprovados para que haja a compensação.

"Todavia, nos casos em que há violação do direito de marca, notadamente naqueles em que há falsificação ou pirataria, o ato ilícito atinge a própria identidade do titular do direito de propriedade industrial", explicou o ministro.

Reputação

Segundo Sanseverino, a diferenciação de produtos e serviços por meio das marcas permite ao consumidor diminuir custo e tempo de informação, pois, com base em suas experiências prévias de consumo, ele tem condições de identificar com mais facilidade o produto ou serviço que deseja adquirir. Por outro lado, explicou, o titular da marca pode investir na construção de uma associação entre a marca e as qualidades específicas do item oferecido, com o objetivo de manter sua clientela.

O relator também lembrou que, como previsto no artigo 130, inciso III, da Lei 9.279/1996, o titular da marca tem o direito de zelar pela sua integridade material e pela sua reputação. Além disso, nos termos do artigo 139 da mesma lei, o proprietário pode exercer um controle efetivo sobre as especificações, a natureza e qualidade dos produtos ou serviços, mesmo que tenha realizado contrato de licença para uso da marca.

"A falsificação, porém, configura uma ingerência ilícita de terceiros nessa identidade marcária, uma vez que ela retira do titular o controle sobre aquilo que está sendo comercializado sob o sinal protegido. O consumidor – ludibriado – passa a relacionar o signo distintivo com valores e qualidades diferentes daqueles aprovados pelo titular do direito de propriedade industrial, em usurpação de identidade causadora de inegável dano extrapatrimonial", disse o ministro.

Direitos de personalidade

Nesse sentido, Paulo de Tarso Sanseverino enfatizou que a violação aos direitos de personalidade também deve ser protegida no caso das empresas, por disposição expressa do artigo 52 do Código Civil, "razão pela qual os danos extrapatrimoniais, em casos como o presente, são presumidos diante da ocorrência do ilícito".

Com o provimento do recurso especial, a Terceira Turma condenou a microempresa e a microempreendedora individual que comercializaram as peças falsificadas em pequenos estabelecimentos no interior de Santa Catarina, além do ressarcimento dos prejuízos materiais do titular da marca, ao pagamento de danos morais no valor de R$ 5 mil, cada.

 

Bem de família é impenhorável se dado em garantia por sócio de empresa

A exceção do artigo 3º, inciso V, da Lei 8.009/90, somente é admitida quando a garantia é prestada ou se reverte em benefício da família, o que não se pode presumir quando a garantia hipotecária é outorgada em favor de entidade empresarial, ainda que vinculada à pessoa física prestadora da garantia real.

Com base nesse entendimento, a 22ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo deu provimento ao recurso de uma devedora e declarou a impenhorabilidade do imóvel da família dado como garantia da dívida.

Consta dos autos que o crédito objeto do contrato firmado entre as partes não foi destinado às pessoas que assinaram a garantia. O crédito, na realidade, foi direcionado à empresa da devedora. Sendo assim, ela sustentou que o imóvel de sua família não poderia ter sido penhorado. Os argumentos foram acolhidos pelo TJ-SP, por maioria de votos.

"Mostra-se necessário reconhecer a mitigação do princípio da autonomia da vontade, a ponto de não poder prevalecer a renúncia à impenhorabilidade do bem de família dado em garantia de dívida, na medida em que a proteção não somente é dada ao devedor, mas também à sua família", disse o relator, desembargador Roberto Mac Cracken.

Segundo ele, houve, neste caso, uma típica relação comercial, que somente deveria abranger bens e interesses das pessoas jurídicas envolvidas: "A empresa exequente não comprovou nos autos que a transação firmada para fim empresarial com constituição de hipoteca para garantia de dívida da pessoa jurídica foi revertida em benefício da embargante ou de sua família, ônus da prova que incumbe ao credor".

Diante da irrenunciabilidade do bem de família, da ausência de comprovação de benefício da embargante e da comprovação de sua residência atual no imóvel objeto da lide, a turma julgadora entendeu que, preservando-se o bem de família, ocorre "indiscutível prestígio à proteção da entidade familiar e ao insuperável princípio da dignidade da pessoa humana".

No entanto, o terceiro juiz, desembargador Alberto Gosson, divergiu do relator. Para ele, não está preenchido o requisito para afastamento da constrição real sobre o imóvel e, por isso, votou pelo não provimento ao recurso. 

Processo 1002121-11.2019.8.26.0004

Em promissória com duas datas de vencimento, prevalece a que melhor reflete a vontade do emitente

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu provimento ao recurso de um credor para possibilitar o prosseguimento da execução de uma nota promissória com duas datas de vencimento. Para o colegiado, deve prevalecer a data posterior, já que a outra é idêntica à da emissão do título, podendo-se presumir que a data posterior seja a real manifestação de vontade do emitente quanto ao dia de pagamento da dívida.

Na hipótese dos autos, duas datas de vencimento constam do título: uma por extenso, a outra em algarismos. A data por extenso, adotada pelas instâncias ordinárias como marco temporal para a promissória, coincide com a data de emissão.

A sentença considerou que, verificada divergência entre dados da promissória, prevaleceria a informação aposta por extenso, por aplicação analógica da regra da Lei Uniforme de Genebra relativa às indicações do valor da dívida (artigo 6º do Decreto 57.663/1966).

Assim, o juiz julgou procedentes os embargos do devedor e declarou a prescrição da execução, proposta em julho de 2011 e relativa a um título cuja data de vencimento considerada foi fevereiro de 2008 – intervalo superior aos três anos previstos pela Lei Uniforme de Genebra para a execução. O Tribunal de Justiça de São Paulo manteve a sentença.

No recurso especial, o credor afirmou que a coincidência da data de vencimento por extenso com a data de emissão do título seria fruto de erro, pois as partes teriam combinado que a nota seria paga em julho de 2008.

Vontade​​ presumida

Segundo a ministra Nancy Andrighi, relatora, não é cabível a incidência analógica do artigo 6º da Lei Uniforme de Genebra – que diz respeito especificamente à divergência de valores no título – para considerar a data escrita por extenso como a que "oferece maior garantia de verdade, por se achar menos exposta a erro, adição ou falsidade do que a soma expressa em algarismos".

Segundo a Ministra, ao prever métodos de resolução de ambiguidades nos dados da cártula, "o escopo buscado pela Lei Uniforme é de preservar ao máximo a manifestação de vontade do emitente", de forma que, na hipótese dos autos, não seria possível presumir como vontade do sacador da nota promissória que a dívida fosse exigível no mesmo momento em que ele assinou a promessa de pagamento.

A relatora ressaltou que "a nota promissória é um título de crédito próprio, e, como tal, se propõe à concessão de um prazo para o pagamento, distinto da data da emissão da cártula, de forma que não faz sentido a emissão de uma nota promissória com data de vencimento coincidente com a data de emissão".

Ela concluiu que, "se, entre duas datas de vencimento, uma coincide com a data de emissão do título – não existindo, assim, como se entrever, nessa hipótese, uma operação de crédito –, deve prevalecer a data posterior, ainda que eventualmente expressa numericamente, já que, por ser futura, admite ser presumida como a efetiva manifestação de vontade do emitente", afirmou a relatora.

Defeit​​o suprível

Nancy Andrighi destacou que, embora a Lei Uniforme de Genebra não tenha tratado diretamente da hipótese de divergência entre as datas de vencimento, deve-se considerar que este defeito pode ser suprido, uma vez que o artigo 76 menciona que a data de vencimento não é pressuposto essencial da promissória.

"Portanto, se a Lei Uniforme de Genebra não tem disposição expressa sobre a disparidade de expressões da data de vencimento da dívida, deve prevalecer a interpretação que empreste validade à manifestação de vontade cambial de uma promessa futura de pagamento, a qual, na nota promissória, envolve, necessariamente, a concessão de um prazo para a quitação da dívida", concluiu.

 

Motorista que só acompanhava abastecimento de caminhão não receberá adicional

O ingresso na área de risco apenas nessa situação não caracteriza periculosidade.

A Oitava Turma do Tribunal Superior do Trabalho rejeitou o recurso de revista de um ex-motorista da Harsco Metals Ltda., do Rio de Janeiro (RJ), que cobrava da empresa o pagamento do adicional de periculosidade pelo contato com inflamáveis ao abastecer o veículo. Ele apenas ingressava na área de risco para acompanhar o abastecimento, e, nesse caso, não há previsão para o deferimento do adicional.

Perigo

A atividade do empregado era dirigir o caminhão com o qual ele retirava a escória da aciaria (resíduo gerado em siderurgias na etapa de refino do aço) e a transportava até o canteiro da Harsco para ser processada. Na ação trabalhista, o motorista disse que levava o caminhão para abastecer uma vez a cada dois dias de trabalho e permanecia dentro do veículo por cerca de 10 minutos. 

Terceiro

O juízo da 2ª Vara do Trabalho de Cubatão deferiu o adicional em grau médio para o empregado, mas o Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (SP) reformou a sentença. O TRT considerou que a permanência do motorista em área de risco era esporádica e, por isso, ele não teria direito ao adicional. Na visão do Tribunal Regional, a prosperar a tese do empregado, “qualquer trabalhador que utilize veículo motorizado e o abastece a cada dois dias faria jus ao adicional de periculosidade”.

Infortúnio

Ao recorrer ao TST, o motorista sustentou que o contato com o agente inflamável a cada dois dias, por 10 minutos, não pode ser considerado tempo reduzido ou esporádico, mas habitual. Segundo ele, “o infortúnio não tem dia nem hora para ocorrer, bastando apenas uma fração de segundos para ceifar a vida do trabalhador".

Jurisprudência

A relatora do recurso de revista, ministra Dora Maria da Costa, explicou que, de acordo com a jurisprudência do TST, a atividade desenvolvida pelo empregado que ingressa na área de risco apenas para acompanhar o abastecimento do veículo não se encontra definida no artigo 193 da CLT e na Norma Regulamentadora 16 do extinto Ministério do Trabalho, sendo indevido, portanto, o adicional de periculosidade nessa hipótese.

A decisão foi unânime.

Serviço que não alcança objetivo gera inadimplemento total do contrato, diz STJ

Uma empresa que cria um programa de computador que alcança apenas parte dos objetivos tecnicamente estipulados em contrato, sem criar comodidade ou melhora efetiva para o trabalho, não incorre em adimplemento parcial da obrigação assumida. Ao contrário, configura verdadeiro inadimplemento.

Com esse entendimento, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça deu parcial provimento a recurso especial para determinar a resolução do contrato e a devolução dos valores pagos por uma empresa de sistemas automotivos que contratou outra, de tecnologia, para criar e implantar um sistema de software para gerenciamento empresarial.

O objetivo do contrato era que a empresa de tecnologia criasse um programa que substituísse com vantagem os sistemas até então usados pela automotiva no gerenciamento de sua atividade empresarial. Esse sistema não foi integralmente implementado, segundo a empresa de tecnologia, porque a contratante fez muitas modificações e ampliações do pedido.

As instâncias ordinárias concluíram que o inadimplemento foi parcial porque ao menos parte do sistema foi implantado, inclusive porque a empresa contratante reconheceu essa circunstância ao assinar confissão de dívida. Esse entendimento foi reformado pela 3ª Turma.

Ao analisar o caso, o ministro Moura Ribeiro explicou que a definição do descumprimento parcial ou total do contrato não passa apenas pela conduta do contratado, mas também pela intenção das partes no momento da contratação e o proveito efetivamente auferido.

"Para se afirmar que houve cumprimento parcial do contrato, e não verdadeiro inadimplemento, é fundamental que a prestação, ainda que de forma deficitária ou incompleta, tenha atendido ao interesse jurídico da parte contratante", disse.

Não foi o que ocorreu no caso concreto. A moldura fática do acórdão recorrido mostrou que o sistema criado e parcialmente implementado não superou, com vantagem, os sistemas utilizados anteriormente.

Ou seja, quem se compromete por contrato a desenvolver um sistema computadorizado para fomentar a atividade empresarial do contrato, embora não esteja obrigado a propiciar lucros financeiros, deve entregar uma ferramenta que atenta às especificações técnicas previas nesse contrato.

 "A perícia, conforme destacado no acórdão recorrido, apurou que esse novo programa não funcionou direito ou, pelo menos, não funcionou da forma esperada. Isso, segundo penso, é o que basta para a resolução do contrato com fundamento no inadimplemento da obrigação contratada", afirmou o ministro Moura Ribeiro.

Segundo o advogado que patrocinou o caso, o TJ-SP tratou a questão como se o contrato de desenvolvimento e implementação de software tivesse natureza de obrigação de meio e não de resultado. "O STJ, ao dar provimento ao recurso, colocou as coisas no seu devido lugar: quem se compromete a desenvolver e implementar um software, assume uma obrigação de resultado e só atinge o adimplemento com a entrega e o pleno funcionamento do software", afirmou. 

 

Inclusão de imóvel rural em perímetro urbano não desobriga a constituição de reserva legal

A Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que a inclusão de imóvel rural no perímetro urbano do município não extingue a obrigação anterior de implementar a reserva legal, a qual só será extinta com o registro do parcelamento do solo para fins urbanos, conforme legislação específica e as diretrizes do plano diretor municipal.

Com esse entendimento, o colegiado deu provimento a recurso do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) para aplicar as disposições do antigo Código Florestal à área de uma empresa de sementes, que tinha natureza rural à época em que o órgão ministerial requereu a averbação da reserva, em razão de ela não ter sido constituída.

O MPMG ajuizou ação civil pública ambiental em julho de 2007 contra a empresa, requerendo a instituição da reserva legal e outras providências. A sentença julgou os pedidos improcedentes, ao fundamento de que, em 5 de agosto de 2011, o imóvel, anteriormente rural, passou a ser considerado em área de expansão urbana. O Tribunal de Justiça de Minas Gerais também entendeu não ser hipótese para o reconhecimento do direito à reserva legal, não se aplicando as normas da Lei 4.771/1965 (antigo Código Florestal) nem as da Lei 12.651/2012 (atual Código Florestal).

Vedação ao retroce​​​sso

O autor do voto que prevaleceu no julgamento, ministro Benedito Gonçalves, afirmou que o acórdão recorrido, ao não aplicar a legislação florestal antiga, nem a nova, baseou-se em duas premissas equivocadas.

A primeira foi a de que, se não há reserva legal constituída anteriormente, não é o caso de se aplicar a nova legislação florestal; além disso, se a área não é mais considerada rural, e sim contida em perímetro urbano, também não se qualifica para fins de averbação da reserva legal, a qual só seria obrigatória se fosse preexistente à alteração da natureza do imóvel, de rural para urbano.

Segundo o ministro, se a área pertencia ao meio rural na época em que, em tese, foi descumprida a obrigação de implementar a reserva legal, são perfeitamente aplicáveis as disposições do antigo Código Florestal, pois o STJ entende que, em matéria ambiental, a lei a ser aplicada é aquela vigente ao tempo do fato (tempus regit actum), "posição que assegura o cumprimento do princípio da vedação do retrocesso ambiental".

Prudên​​cia

Dessa forma, o magistrado observou que a norma que incide no caso específico dos autos é aquela vigente ao tempo do fato, razão pela qual a instituição da reserva legal deve ser apreciada sob a perspectiva do antigo Código Florestal (artigo 16, parágrafo 2º).

Para Benedito Gonçalves, embora o Código Florestal de 1965 não tenha tratado expressamente da extinção ou manutenção da reserva legal – diante da passagem da propriedade do meio rural para área de expansão urbana –, "é prudente que se conserve a obrigação, por coerência com o sistema legal de proteção ambiental, até que sobrevenha regulamentação pela legislação urbana do município, com o registro do parcelamento do solo urbano e a observância do regime de proteção de áreas verdes urbanas, conforme previsão do artigo 25 do novo Código Florestal".

O ministro ressaltou que essa solução é compatível e harmônica com a norma inscrita no artigo 19 do novo Código Florestal, que dispõe que "a inserção do imóvel rural em perímetro urbano definido mediante lei municipal não desobriga o proprietário ou posseiro da manutenção da área de reserva legal, que só será extinta concomitantemente ao registro do parcelamento do solo para fins urbanos aprovado segundo a legislação específica e consoante as diretrizes do plano diretor de que trata o parágrafo 1º do artigo 182 da Constituição Federal".

 

Trabalhador que teve contratação cancelada após recomendação de isolamento por comorbidade será indenizado

A empresa riscou a página da carteira de trabalho com o intuito de cancelar o contrato.

Uma construtora terá que pagar R$ 5 mil de indenização por danos morais a um trabalhador que teve a contratação cancelada após o exame admissional recomendar o isolamento social como prevenção de contágio por Covid-19, em função da existência de doença crônica. A decisão, proferida na Vara do Trabalho de Congonhas, é do juiz Josias Alves da Silveira Filho, que reconheceu que a empregadora agiu de forma ilegal.

Informações colhidas no processo apontaram que a construtora precisava contratar um operador de máquinas e, na seleção de candidatos, escolheu o reclamante da ação. Registrou então a admissão na carteira de trabalho e encaminhou o profissional para exame admissional. Porém, após o procedimento, o médico diagnosticou que o trabalhador é portador de doença crônica e não recomendou a contratação, para que ele cumprisse isolamento social diante da pandemia da Covid-19. Por isso, a empresa cancelou o registro do contrato de trabalho na CTPS.

Para o juiz, os fatos expostos pelo trabalhador são incontroversos. Segundo o magistrado, antes de admitir o empregado, o empregador deve encaminhá-lo ao exame médico, conforme prevê o artigo 168 da CLT. “Assim, apurada a aptidão física e mental do trabalhador, para a função que deve exercer, pode o empregador contratá-lo. E, admitido o trabalhador, o empregador tem cinco dias úteis para anotar a CTPS, prazo previsto no artigo 29, caput, da CLT”, ressaltou o julgador.

Mas, no caso, de acordo com o juiz, ficou provado que a construtora fez o processo de forma inversa. Ela anotou a CTPS do reclamante antes de concluir o exame médico. E, ao receber a conclusão do médico, riscou a página da carteira de trabalho com o intuito de cancelar o contrato.

O magistrado ressaltou que a carteira de trabalho é o documento de identificação do trabalhador, com registro de todas as suas atividades profissionais. “Dela devem constar as anotações legalmente previstas, em especial aquelas do artigo 29, caput e parágrafos, da Consolidação das Leis do Trabalho”, explicou o juiz. E, segundo o magistrado, a anotação de dados, seguida de um risco diagonal, na página inteira, com a palavra “cancelado”; gera dúvidas que podem prejudicar o trabalhador. “Principalmente para futuros empregos, o que evidencia ofensa à sua honra objetiva, em danos morais cuja reparação pecuniária é devida”, concluiu o julgador, determinando a indenização de R$ 5 mil. Há recurso pendente de decisão no TRT-MG.