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A compensação como instrumento para denúncia espontânea.

O artigo 138 do CTN estabelece que a denúncia espontânea da infração tributária assegura a exclusão da responsabilidade tributária quando acompanhada do pagamento do tributo e juros de mora, afastando-se, assim, a necessidade de pagamento de quaisquer outras penalidades, sejam elas multa de mora ou de ofício.

Recentemente, mais especificamente em 16 de agosto de 2019, a Coordenação-Geral de Tributação da Secretaria da Receita Federal – COSIT, emitiu a Solução de Consulta nº 233/2019 que, ao interpretar as regras aplicáveis à denúncia espontânea, entendeu que a “extinção do crédito tributário mediante compensação não equivale ao pagamento referido pelo artigo 138 do CTN”.

Assim, segundo a COSIT, não obstante a compensação seja expressamente uma das hipóteses de extinção do crédito tributário previstas no rol do artigo 156 do CTN, tal modalidade de extinção não deveria ser considerada para fins de denúncia espontânea e, assim, como instrumento hábil a excluir a incidência das multas de ofício ou mora que a denúncia espontânea adota pelo Contribuinte vise eliminar.

Considerando tal contexto, na coluna de hoje abordaremos recente acórdão da Primeira Seção do CARF que, em sentido diametralmente oposto àquele exposto na SC 233/2019, decidiu de forma unânime que “a compensação é meio hábil para caracterização de denúncia espontânea, nos termos do art. 138 do CTN, cuja eficácia não se restringe ao adimplemento em dinheiro do crédito tributário”. (Acórdão nº 1401-003.535).

Discutia-se nos autos a homologação apenas parcial de compensações levadas a cabo pelo Contribuinte, pois no entender da Fiscalização os créditos apresentados eram insuficientes para quitação dos débitos declarados. Para chegar a tal conclusão, argumentou o Fisco que aos valores dos débitos declarados deveria ter sido adicionada a multa de mora tendo em vista a quitação a destempo. Para justificar tal entendimento, alegou o Fisco que a compensação implementada não teria os mesmos efeitos de uma denúncia espontânea, pois os benefícios (exclusão de multa de mora ou de ofício) de tal instrumento somente seriam aplicáveis quando o Contribuinte utilizasse o “pagamento” em guia DARF como meio para extinção do crédito tributário.

Desde logo refutamos a posição do Fisco e expressamos a nossa opinião no sentido de concordar integralmente com as conclusões alcançadas no julgado acima exposto. Com efeito, nos termos do artigo 156 do CTN, a compensação configura-se em uma das hipóteses legais de extinção do crédito tributário. Por sua natureza, assim como pelas regras aplicáveis aos procedimentos de compensação, tal modalidade de extinção do crédito tributário pode ser implementada antes mesmo do início de qualquer procedimento de fiscalização, de modo que não há neste aspecto qualquer distinção em relação ao pagamento em dinheiro ou compensação para fins de extinção do crédito tributário e, portanto, também para fins de caracterização de denúncia espontânea.

Conforme bem colocado no acórdão em comento, o termo “pagamento” constante do art. 138 do CTN deve ser interpretado em sentido amplo, de modo que também a compensação, hipótese legalmente prevista para extinção do crédito tributário, deve ser considerada como equiparável ao pagamento nos termos do art. 138 do CTN.

A esse respeito, bastante consistente a argumentação exposta pelo Conselheiro-relator ao fazer um paralelo com as disposições do art. 150 do CTN, que trata das condições aplicáveis ao lançamento por homologação. Isso porque é sabido que o crédito tributário sujeito ao lançamento por homologação pode ser quitado via compensação, tendo o próprio artigo 150, §4º do CTN equiparado tal situação como uma “antecipação do pagamento, sob condição resolutória”.

Ora, se para fins de lançamento por homologação as compensações realizadas pelos Contribuintes são equiparadas a pagamentos, mesmo que sob a condição resolutória, por qual razão também não aplicar os efeitos do pagamento, ou seja, extinção do crédito tributário, em relação às compensações realizadas antes do início de qualquer procedimento de fiscalização e, assim, sujeitar a tais procedimentos os efeitos de uma denúncia espontânea?

Justamente por não concordar com tal discrepância de tratamento, não teve dúvidas a 1ª Turma, da 4ª Câmara da Primeira Seção do CARF, em dar provimento ao recurso voluntário do Contribuinte para que a Fiscalização da unidade de origem procedesse a um novo exame das compensações, mas sem considerar os valores de multa de mora, na medida em que as compensações levadas a efeito pelo Contribuinte se constituíam em meio hábil para caracterização da denúncia espontânea.

De se destacar, por fim, que o tema discutido no acórdão aqui comentado ainda é, infelizmente, objeto de divergência no âmbito das turmas do CARF e CSRF. Conforme bem exposto pelo relator, “temos decisões para ambos os lados nas diversas Turmas e Câmaras Superiores”, situação esta que traz uma dose extra de insegurança para os contribuintes em um tema que, pela sua simplicidade, não deveria ser objeto de maiores questionamentos.

A corroborar com o estado de incerteza, não obstante a tendência de consolidação de um entendimento definitivo do CARF em favor dos Contribuintes no tema aqui em destaque, é preocupante a recente manifestação da COSIT na SC 233/2019, em sentido oposto àquele que vem se tornando majoritário no CARF. Tal solução de consulta nos parece uma última tentativa do Fisco insurgir-se contra o reconhecimento dos efeitos da denúncia espontânea às compensações, situação esta que poderá ocasionar cada vez mais litígios, tendo em vista o efeito vinculante de tal solução de consulta aos agentes fiscais, conforme previsão contida no artigo 9º da IN/RFB nº 1.396/2013.

De qualquer maneira, mesmo considerando a tentativa do Fisco de esvaziar o entendimento favorável aos Contribuintes que vem formando no âmbito do CARF, temos a expectativa que as conclusões expostas no acórdão aqui exposto passem a ser adotadas de forma pacífica pelas demais turmas integrantes do daquele órgão julgador, de modo a proporcionar certeza e segurança jurídica que os Contribuintes buscam ao acessar o CARF.