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Sistema tributário brasileiro: mudar é preciso

Quando o assunto é o sistema tributário brasileiro, especialistas não hesitam em apontar a necessidade de um reforma capaz de melhorar a eficiência econômica e diminuir o impacto negativo sobre a distribuição de renda, mas ressaltam que o principal entrave para sua implementação está nos critérios políticos que se sobrepõem aos técnicos. O professor doutor da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP, Adriano Henrique Biava, defende que a reforma tributária deveria partir da consolidação dos tributos da União, dos Estados e dos Municípios com unificação de alíquotas. “Do ponto de vista de alteração constitucional é a tributação indireta que deve ser objeto de reforma”.

Para o economista e pesquisador do IBRE/FGV, José Roberto Afonso, o ponto de partida de uma reforma tributária no Brasil é a negociação política. “Tem que começar por negociação política e por um desenho técnico das grandes linhas, só depois se deve escrever a emenda constitucional, ou seja, exatamente ao contrário do que tem sido feito nas últimas tentativas frustradas de reforma”. O diretor da LCA Consultores, Bernard Appy, aponta diferentes situações a serem resolvidas por meio de reforma tributária envolvendo a necessidade de se reduzir a alíquota interestadual do ICMS com o objetivo de disciplinar a “guerra fiscal”, definir o que gera créditos tributários com relação ao ICMS e ao PIS e Cofins e ainda resolver a dificuldade que as empresas têm de recuperar os créditos acumulados. Ele explica que a atual situação do ICMS mantém uma estrutura favorável para a concessão de incentivos ilegais, além disso, “a tributação na origem gera sérias distorções porque estimula os estados a conceder incentivo para a importação e desestimula a atrair empresas exportadoras".

A falta de clareza na definição sobre a geração dos créditos tributários, segundo Bernard, causa problemas de ineficiência econômica e de demandas judiciais entre as empresas e o Fisco. “A incidência cumulativa ao longo da cadeia prejudica a competitividade do produto nacional já que o imposto que incide sobre o produto nacional é mais alto do que sobre o importado e na exportação você exporta o imposto que incidiu cumulativamente na cadeia e que não foi compensado. Isso gera problemas seriíssimos de contencioso, o nível das disputas entre empresas e o Fisco sobre o que gera crédito de ICMS e de PIS e Cofins é enorme. E isso tem um custo enorme tanto para as empresas quanto para o Fisco. Acho que as reformas deveriam caminhar para se ter tanto no PIS Cofins como no ICMS o crédito financeiro, ou seja, tudo aquilo que a empresa adquire gera crédito para empresa, exceto para produtos muito específicos”, esclarece.

De acordo com os especialistas os efeitos de uma reforma ampla seriam sentidos na melhora da eficiência da economia e na distribuição de renda. José Roberto Afonso acredita que uma reforma ampla seria capaz de “melhorar a justiça fiscal para as pessoas e a competitividade para as empresas”. Para Bernard Appy uma reforma ampla causaria efeitos na eficiência econômica e “em certa medida” contribuiria para uma distribuição de renda mais justa. “O impacto de longo prazo é ter um crescimento maior e uma distribuição de renda mais justa na economia, embora, eu volte a falar que a questão distributiva do ponto de vista tributário é limitada”.

Já Adriano Biava pondera ao dizer que os efeitos de uma reforma tributária podem variar de acordo com os seus objetivos. “Já tivemos mudança que resultou em maior concentração de renda. A partir de 1988 tivemos uma mudança que resultou na melhoria da distribuição da renda. Acho que uma reforma com o aumento da progressividade do imposto de renda e uma reorganização dos tributos indiretos que beneficiassem o consumo de produtos populares, isso resultaria numa melhora na distribuição da renda”.

No que se refere a formas de implementação os especialistas concordam que é possível realizar uma reforma ampla, porém “em partes” e com objetivo de longo prazo muito claro. “Ao se fazer [a reforma] em várias etapas é preciso ter um norte muito claro. Precisa ter clareza de onde se quer chegar e que as mudanças sejam sempre feitas visando se aproximar mais daquilo que seja o ideal de longo prazo e não feita de forma aleatória, não se pode dar um passo para frente e dois para trás, pode-se dar um passo por vez mas sempre numa direção correta”, diz Bernard Appy.

“Uma reforma deve ser fatiada na sua implementação, na discussão, na tentativa de aprovação ,mas tem que ter um horizonte do que se vai fazer lá na frente o que não sei se o governo tem. E que essas decisões fatiadas sejam parte de um todo coerente lá na frente”, concorda Adriano Biava.

Os critérios políticos são apontados como uma das maiores barreiras para uma reforma. “Talvez o maior [entrave] seja vontade política. Como se arrecada muito, o risco de uma reforma é grande, logo, precisa que o governante que comande e decida esse processo tenha grande consciência da premência da reforma, capacidade de aglutinar apoios e sobretudo de negociar, e perseverança para mudar, ainda que seja aos poucos”, diz José Roberto Afonso.

Para Bernard Appy os benefícios de uma reforma tributária que simplifiquem o sistema e aumentem a eficiência são difusos a ponto de não serem percebidos no setorialmente. “Quando se tem benefícios difusos se tende a ter menos apoio político. No caso do ICMS tem um complicador que é a questão federativa, a disputa dos estados por receita. Nenhum estado quer perder receita, inclusive, a possibilidade de usar a guerra fiscal como instrumento de desenvolvimento regional mas isso tem que ser coberto por uma política eficaz por parte do governo federal”, conclui